o presente de Natal
A crise já cá tinha chegado há muito tempo...
Saído de casa pelos seus 17 anos... Acabado de perder muita coisa... Vai reiniar vida em casa sem água canalizada, como já vivenciara anos antes... Era a sua casa de parcos anos...
Acartava a água como um aguadeiro.
Já sabia em tenra idade que o pequeno regador que lhe tinham arranjado levava 5 litros... e que tinha que ir à bica 4 vezes para encher o balde grande que aguardava em cima do móvel de cozinha... e já sabia o que era o 20 e o 10 e o 15...
Já na altura mandava nos adultos indicando-lhes como poupar o bem precioso...
A rua descia mais depressa do que subia... e lá arranjava metas por onde parar...
Desta vez só paro uma vez em toda a subida... Desta vez não vou parar... e eram essas as suas conquistas... o conseguir subir a rua desde a bica até ao balde grande sem parar...
Por vezes de já tantos paralelos gastar, lá parava para descansar...
Como a base do regador era pequena, esquecia-se de encostar a perna para o segurar... e lá se virava um regador de água para lá do meio do caminho...
Mais meia viagem perdida... como tantas outras meias viagens ao longo de sua vida...
Lá vai conseguindo tratar das crises que vão surgindo... por vezes parando a meio, outras vezes seguindo sem parar...
Esta tá quase...
E esse vai ser o presente de Natal mais belo que te poderei dar...
A paz... a paz de uma viagem sem crises...
A paz de uma viagem com paragens e sem metas...
A paz de uma viagem tão pura como a água que acartava no regador pequeno...
A paz da água de antigamente...
A bica ainda por lá existe... e ainda brota...
Que a nossa nascente continue para sempre a brotar... e nem que seja necessário ir viver de novo para casa sem água canalizada... mas viveremos em pleno!... e desta vez vamos os dois à bica... e guardaremos o regador pequenino... porque um dia, quem sabe, veremos um outro puto com as mesmas metas do puto de outrora...
Ainda ecoam os Zézinhos de voz quente de avó...
Ainda ecoam os Zés da tua voz quente...
Um dia ouvirei tua voz ecoar no meio da Natureza aclamando a semente... a nossa semente... o maior presente!...
Um xi
JV
7 Comments:
há beijos que dizem
que somos amados
são beijos longos
Que andam e cheiram
nascem dos narizes
e percorrem bochechas...
olhos...
repouso de lábios
suaves
em testas ciliadas
Um beijo :)
Bom fds
Um blog interessante e a visitar brevemente!
Gostei das palavras, dos desabafos...
Cumprimentos intemporais *
Que a magia do Natal chegue aos corações de todos!
A ti em especial desejo-te um Natal sem limites, repleto de tudo aquilo que mereces!
Beijocas Intemporais!
Grazzie... O mesmo para ti...
Continuamos nas trocas de palavras afastadas de olhares...
Tudo de bom
JV
Era uma vez há muito, muito tempo…
O tempo… Era sabido que um milénio tinha mil anos, que um século tinha cem anos e que um ano estava dividido em duodécimos de sal.
Alguém inventou o relógio e todos soubemos contar o tempo, controlar o tempo, dividir o tempo. Quanto tempo? O relojoeiro tornou-nos escravos de 60 segundos que eram seus. Ele não sabia que o tempo se dobra sobre si mesmo e cresce exponencialmente nas voltas de um tempo vazio de engrenagens.
Maria olhou o espelho, esse gesto que evitava havia tempo, acariciou a ruga expressiva no canto do olho esquerdo e os papos de maus rins por baixo do olho direito. As brancas iniciaram a cobrir a testa e ela teimava agora em deixá-las crescer. Abriu o decote… estava ainda firme o pescoço e o rego de entre os seios era ainda promissor. Tinha no peito as marcas do acne que teimava em aparecer-lhe quando os ovários estavam a “entregar os pontos”. Há um tempo em que o tic-tac ecoa longínquo e cada minuto tem o tempo que fizermos ter. O relojoeiro não sabia que havia um tempo em que o tic-tac parava para que a vida se pudesse contemplar sem pressa. Não, o relojoeiro não sabia que há segredos que fazem liberdade da escravidão do tempo.
Era uma vez há muito, muito tempo um reino junto ao mar onde vivia Maria. Havia nesse reino a paz do tempo tecido de longos cabelos em grandes teares de luz. Cada volta de tempo tinha o tempo da fina e branca areia do seu reino abotoar a abundância jorrada do nada, esse movimento de vento sobre mar que Maria abotoava à manta com que se encobria.
Num dos dias, em que sentada na sua pedra, abotoava botões de tempo, moveu-se intensamente a areia por baixo do seu assento, afundando um pouco a pedra. Achando estranho tal movimento, parou Maria de tecer o tempo e levantou a ponta da sua manta para melhor observar o que passava. O mar tinha chegado à pedra e escavava a fundação da sua pedra. Voltou a encobrir-se na sua manta tecida de longos cabelos abotoada de tempo, levantou-se e moveu a sua pedra para mais perto da verdejante mata que acabava nas dunas e continuou tecendo os seus longos cabelos em voltas de luz.
Chegou a noite e Maria parou de tecer o tempo. Dobrou delicadamente a manta e elevou-a por sobre a noite iluminando-a. Todos os luzeiros abriram espaço por entre as nuvens e o céu mostrou todo o seu esplendor. As areias iniciaram a mover-se e brancos castelos de torres altaneiras se ergueram sobre o ar. A mata avançou sobre a praia e por entre as árvores grandes lagos salgados espelhavam a prata derramada do luar.
Subiu Maria para a sua pedra. Bateu com o seu delicado pé 3 vezes a pedra e a pedra elevou-se por sobre os castelos deixando Maria na torre mais altaneira de onde vinha som de alaúdes.
Sons barrocos envolviam longas vestes de cortesãs, dançava-se no grande salão da altaneira torre as mais doces melodias. A chegada de Maria encheu de alegria o salão e todos, em mesura cortês, a saudaram.
De entre os cortesãos surgiu um belo moço que se dirigiu a Maria lançando-lhe uma vénia. Respondeu Maria com um sorriso mas o moço insistiu na vénia, estendeu-lhe a mão, convidando-a para dançar. Maria estendeu a mão no gesto de aceitar mas perturbou-se com a beleza do moço e convidou-o para assistir ao baile.
Subiram os degraus e repousaram sobre a pedra. Olhando a vida que os envolvia. Do olhar do moço podia Maria ler as mais doces palavras e essa doçura fê-la querer. Nunca tinha experimentado antes; -querer e assustou-se. Ergueu o braço e recolheu a manta do tempo. A música parou, as cortesãs desmaiaram de susto, as altaneiras torres derrocaram, todos os luzeiros se apagaram no céu e sob a lua Maria transmutava-se crescendo em ódio. As matas recolheram-se e a areia branca voltou ao seu lugar de abotoar a abundância. Maria bateu 3 vezes o pé na sua pedra e a pedra voltou ao seu lugar na praia. Maria encobriu-se na manta.
Todos desapareceram e Maria sentiu pousar um calor diferente em seu corpo. Esse calor começou a envolvê-la e a abrir lentamente a manta do tempo que a cobria. Descobriu a cara e o sorriso do moço aqueceu-lhe o coração.
Suavemente o moço abriu-lhe a face arrumando os longos cabelos que a envolviam e convidou-a a olhar os lagos prata sob a lua:
- Vou colocar no céu 7 irmãs que façam companhia à lua
- Melhor dar-lhe um touro que as protejam
- Que tal a ferocidade da ursa?
Maria sorriu na melodiosa paz da voz do moço
- Perdi o Norte
- Uma polar que as oriente?
- Que belo ficou o lago
- O reflexo da diversidade é mais belo que a grandiosidade de um só.
Um a um Todos os luzeiros da noite tomaram o seu lugar e a manta iniciou a desabotoar o tempo. Todos os tempos se soltaram, os tempos da raiva e os tempos de tranquilidade, os tempos da guerra e os tempos da paz, os tempos do ódio e os tempos de amor. Todos os tempos se dobraram sobre si mesmos e se interpenetraram.
A areia voltou a mover-se intensamente por baixo da pedra onde Maria se sentava. O moço saltou da pedra e ofereceu a Maria mão a que se apoiasse. A pedra iniciou a afundar-se e Maria saltou do alto da sua pedra para o areal onde a mão amiga do moço a conduziu. Nunca tinha experimentado antes o tacto quente e macio do areal, o veludo das águas que lhe lavavam os pés e o calor daquela mão que a conduzia pelo areal.
- Quem és tu? Porque caminho descalça?
- Procura no teu coração e encontrarás o meu nome. Solta os teus pés e encontrarás os teus passos.
Maria voltou-se para o moço que a acolheu num abraço. O calor do corpo soltou a volúpia e o amor derramou-se nas areias brancas sob os luzeiros do céu….
É no tânger das cordas cósmicas
Que se ouvem os suspiros
Da hora de todas as sedas
Enleva-te ó lua
Que é da tua alquimia
Que o ténue faz a luz…
Abre, pelo breu da noite
Manhãs infinitas de sonhos
Marés de sensações
Escorrentes do sono
Que teima em não dormir
Vagueiam
Memórias e experiências
Que a imaginação
Secretamente fabricou
Quimeras
Fantasias…
Devaneios
De dedos prenhes
De emoção
Maria olhou a lua e acariciando a mão que a segurava sorriu:
- Tu és o Jardineiro das Rosas.
Havia homens que o eram… Jardineiros de Rosas que faziam o próprio tempo com tempo e desse tempo havia memória ridente porque esse tempo era inteiro sem divisão ou controlo de relojoeiro.
Rosa afagou a ruga que se começava a desenhar no canto do lábio e sorriu ao espelho
Natal de Sedas
Gratíssimo...
idem
Enviar um comentário
<< Home